quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

do ato de perder o sono

...loucura.

eu não absorvi NADA do que aconteceu hoje. Achei que a ligação "parabéns, seu nome está lá" era trote. Achei que fosse gritar mais, chorar mais. Talvez porque, como se diz popularmente, a ficha ainda não caiu.

COMO eu sonhei com esse momento. sonhei mas ao mesmo tempo perdi noite - mal dormidas, gastas com o stress de provas, simulados, lições mal feitas ou não terminadas. Eu chorei de pensar em falhar, mas também chorei só me imaginar vendo o nome na lista. Eu sorri de imaginar, após longa caminhada, chegando à reta final - afinal, tudo foi uma correria sem fim. Seja no metrô, pra chegar à aula logo cedo ou pra chegar no simulado domingo de manhã. As vezes em que lia no onibus, morrendo de sono ou de vontade de ficar em casa no colo da minha mãe. Pelas terças-feiras - muito estressantes, em sua maioria - pelos 4 em redações, pelas aulas de matemática do Émerson. Por todos os TROCENTOS de exatas das apostilas, pelo acampamento que eu montei no plantão de duvidas em 2008 e por todos os choros e reclamações infinitas por não entender movimento circular, soluções e sistemas lineares. Eu me engasgava com geologia e relevo, rebolava a saia quando o assunto era a historia dos EUA. Não conseguia memorizar a PORRA da tabela de zoologia - platelmintos, nematelmintos, triblásticos, acelomados, pseudocelomáticos e a putaqueopariu. Verbos em português?! nossa que inferninho lembrar dos nomes em especial.

O primeiro ano de cursinho foi PEDREIRA. O segundo foi de busca por equilíbrio - espiritual, pessoal, mental. Acho que muitas provas me foram postas e me fizeram refletir o por quê e até que ponto eu REALMENTE desejava jornalismo. Outro ano de cursinho, a não-obrigatoriedade do diploma, a degradação em que o jornalismo vive em diversos meios pelo mundo (principalmente no que diz respeito à TV). As piadinhas contrastando com os elogios e com os estímulos advindos das mais variadas partes. Dias em que eu senti um tesão absurdo por tudo aquilo que eu sonhava fazer. Outros, dias em que eu achava que jornalismo era a pior e mais tola das opções. Passar 4 anos sonhando com a ECA, chorar toda vez em que eu passava em frente a ela em véspera de prova. Chegara sonhar com Bauru e realmente querer UNESP – e, como brinde, sair de casa ganhar as estradas, a liberdade e uma saudade enorme da minha casa, da minha família, da carne assada da minha avó nos fins de semana e da agitação de São Paulo nos fins-de-semana.

Me achei acomodada por querer continuar assim – afinal, eu tenho uma vida de princesa. Sair de casa, conhecer novos lugares, transferir o seu lar e partilhá-lo com outros universitários que se encontram na mesma situação que você – de abandono, ainda que momentâneo, do lar, da expansão das idéias e do mais diverso mix de sentimentos, obtido a partir da mistura da saudade de casa e da liberdade de se livrar da amarra dos pais.

E hoje eu me encontro assim, embasbacada. Mais engraçado que isso tudo é pensar, durante 9 meses, eu dormia mal pelos exercícios e lições [de exatas em especial, aquele abraços por livros e apostilas de matemática e aquele chute nos benditos juros!]. Pensar que eu gastava aqueles minutos que me eram raros, os quais eu dedicava para pensar em mim, no que se passava em meu interior, para imaginar todas as cenas que estou prestes a viver e para idealizar tudo quanto os filmes clichês de Hollywood e a minha poesia de mal amada me permitissem. Aqueles minutos, encostada junto ao meu travesseiro, nos quais eu me dava o luxo de (tentar) esquecer fórmulas e pensar num livro que eu gostaria MUITO, MUITO de ler. Minutos em que eu tirava para mandar mensagem para os que, mesmo de longe, torciam, avisando-lhes de que eu estava viva e lutando pelo que eu acredito, desejo e busco. Minutos em que eu tomava chá com a minha mãe, contava-lhe as GRANDES novidades de um dia banal, trancado numa sala fria congelada pelo ar-condicionado.

Véspera da primeira fase: uma dor de cabeça e no pescoço INSUPORTÁVEIS (cacete, e agora, e se eu passar mal amanhã?!). Conversar com amigas, sair, espairecer – mesmo morrendo de medo de ser atropelada ali, na véspera da prova e acabar com um dos momentos maaais idealizados da minha vida – nada adiantou. Deitei 10 da noite – algo muito, MUITO estranho – acordar 8 e pouco, anda com dor de cabeça. Conclui, no dia seguinte que, andar e conversar com a mãe na porta de prova, é melhor do que neosaldina e antidepressivo. “Boa Prova, você estudou muito lembra?”.

Passada a primeira fase, o meu sono ( pobre coitado!) foi novamente perturbado. A angustia de contar os pontos (cacete, passei!) e se preparar pra nova segunda fase que era novidade para todos (como assim todas as matérias porra?! Matemática, e agora?!). Eu estudo o que, e como? Começo por onde? Focalizo humanas, priorizo exatas, tento fechar em bio? E agora? Mas, no fundo no fundo, eu sabia que não adiantava perguntar: éramos todos cobaias de um sistema educacional brasileiro mal planejado e cada vez mais falido.

Véspera da segunda fase. Revéillon mal virado, estudando até 5 da tarde, o peso da consciência de não estudar direito no dia 01 (caralho, Dia Mundial de Paz e eu estudando geologia? Pro inferno!). Ler incessantemente os resumos – feitos, refeitos, memorizados, passados a limpo e revistos nos intervalos dos jornais. Desenhar mapas, pintá-los, mesmo estando MORRENDO de vontade de pintar os almanaques da Turma da Mônica (sim, eu sou uma criança). Dia 02 estava eu lá novamente: deita, rola de um lado pro outro. REDÇAÃO, REDAÇÃO, REDAÇÃO. Sonhei que o tema era “cinema” (eu poderia ter relacionado perfeitamente isso com o tema proposta – O MUNDO CONSTRUÍDO POR IMAGENS) . Mas quem disse que eu sou muito lembrada e plenamente convicta desse papo de sonho? No fundo, sou toda revolucionária da boca e da porta de casa pra fora.

Vamos. Entro na Faculdade de educação – dormi aquela noite, mesmo com calafrios com a redação (ironia: e eu querendo prestar jornalismo!). “Podem começar”, disse Odebran, o fiscal da minha sala cujo nome e doçura estão marcados. Ao ler a proposta, veio aquele calafrio MESTRE e aquela sensação de “cacete, ta mais difícil esse ano”. Faz a prova, 2 horas pra redação – ótimo, foi exatamente esse o tempo que eu calculei. Apaga, reescreve, apaga de novo. Muda de prosposta, pensa em novas figuras. Eis que baixa a luz DIVINA: ALMADINEJAD. “Além de dar figuras, ainda mostro que estou atualizada colocando noticias que rechearam os jornais durante MESES”. E lá fui eu. Saio da prova, insegura quanto à redação. Sem querer dar muita entrevista e sem agüentar a curiosidade-ansiedade-angústia (ainda não sei nomear aquilo), decido ver comentários e idéias para a redação. “O candidato deveria interpretar imagem não no sentido literal, mas sim em seu significado abstrato, podendo abordar...”. Caguei. A cada linha lida, a angústia aumentava e a queda da lágrima cada vez mais iminente. Decido tomar banho. Solto tudo o que havia dentro de mim, numa mescla de lágrima, saliva, soluço e desespero. “Calma Lê. Você fica se desesperando e nem sabe o que aconteceu”, dizia a minha mãe. Depois de chorar, mandar mensagem feito louca perguntando o que outros tinham colocado na redação, choro incessantemente e, ao deitar na cama já com os olhos inchados e o coração inundado, minha mãe faz a pergunta ABENÇOADA: Quer que eu deite com você? Nossa, naquele minuto DESEJEI MUITO eu todos, em algum momento da vida, pudessem ter uma mãe ou alguém que lhe oferecesse o silencio do leito, tranqüilidade quebrada pelo barulho dos soluços. Minha mãe me abraça bem forte e, após ironias e piadinhas, afirma: “Calma. Hoje foi só a primeira. Descansa pra amanhã”. Eu ouvi aquilo e disse pra mim: maldito Almadinejad!

Sono? Nem de brincadeira. Cheguei a tal estado de transe que senti estar tendo alucinações - eu ouvindo minha própria voz dizendo “Confia, Deus está cuidando. Deus está no comando. CONFIA”.

Acordo eu, no dia seguinte, 8 e pouco. Cara inchada, olheira e o coração até murcho, de tanta desesperança. Lendo o Estadão do dia seguinte, leio depoimentos de “tema de redação muito abstrato” e professores de cursinho afirmando que, nesse ano, a chance de desviar do tema era muito grande. “ótimo”, pensei. Eu nem queria USP mesmo. Dane-se. Eu só quero que isso acabe logo.

Veio o segundo dia – pedreira pelas queridas exatas. No fim, havia a bendita Mafalda (bendita = ironia da pior), uma questão de física em branco e questões de humanas apertadas (ótimo, a única coisa que eu tinha chance deixei ali, reprimido entre as linhas, com a minha MELHOR caligrafia - ironia da mais chula). “Dane-se jornalismo na USP. Ainda tem UNICAMP semana que vem”, pensei, sem muita convicção.

Veio o terceiro dia. Meu sono? Bom, depois da redação, pensei que o resto era passeio. A pedreira do primeiro dia me destruiu – mesmo eu me CONTROLANDO pra não desesperar e sair chorando, como no ano anterior. Dormi o sono do vestibulando conformado , cujos lemas são: “ta no inferno, abraça o capeta” ou “o que é um peido pra quem já está cagado”. No fundo, eu também sei que rir das próprias tragédias se revelo uma das minhas qualidades nos últimos anos. Saindo 15 minutos de antecipação (ainda assim com medo) encontrei meus conhecidos já na porta – putz, você fez RASCUNHO pra essa prova né? 12 questões em 4 horas é tempo DEMAIS. “É, fiz em algumas sim”, disse eu sem graça.

Sono pisado, acavalado na semana seguinte – sim ela, a boa e velha unicamp. O inferno e um peido pra todo mundo – se vira no tempo, nas matérias, nos desenhos, seja o que Deus quiser! No primeiro dia aquele nabo – adivinha em que matéria. Sim, português, com a boa e maldita MAFALDA [meta para os próximos ano de ECA: destraumatizar-me de Mafalda].

Quarta-feira: ACABOU, pensei eu, com, vontade de gritar, mas abalada pela prova de matemática – claro sempre ela. Acho que isso é uma síndrome – a Síndrome vestibulanda do M: Mafalda, Matemática.

Sexta-feira peguei o avião. Conquanto o medo dos 5 aviões que me esperavam nas próximas duas viagens me corroesse, sabia que aquilo iria libertar-me dos pseudo-problemas vestibulandos.

Ontem: o frio na barriga já se inicia pelas 10 da noite (não pense que meu sono foi de todo tranqüilo na viagem: ainda que desligada da minha vida em SP, o ar-condicionado, o calor infernal, a cama estranha sem o meu quarto não me deixam dormir totalmente em paz). “Cacete, eu estava tranqüila pra amanha até agora”, pensei eu, após falar ao telefone com dois amigos que, apesar de não estarem esperando lista, estavam mais ansiosos e nervosos do que eu mesma. Amanha vou numa lan-house, desligo o celular e, se for pra ficar com cara de bunda pela não-aprovação, que eu fique sozinha. No máximo, com a minha mãe. Durmo lendo um dos meus calhamaços de férias. Durmo mal. Acordo 7 da manha, após a maior série de pesadelos de que me recordo. Três sonhos, três listas sem meu nome Alessandra X Alves e Alessandra Góes X. Tudo, MENOS ALESSANDRA GOES ALVES. Decido ver filme – Ben-Hur, ainda tenho 2 horas e meia pra ver. Acaba lá pelas 10, já terei matado quase que a manhã toda. Acaba o filme, ajudo no almoço (Intensivão Bauru: aprenda a cozinhar em 20 dias para poder se virar na república, falar com a coordenadora Sandra, vulga MINHA MÃE). 11, meio-dia, a fome batendo – eu já não diferenciava fome de nervosismo e ansiedade. Almoço, vejo seriado, deito na cama pra ler um pouco, dou banho nos papagaios (senti mais uma vez quanto eles são capazes de absorver a atmosfera, a energia ao seu redor. Ambos imóveis, me olhavam, parados, como se respeitassem meu silencio e partilhassem da minha angústia). Apesar do medo (os guerreiros têm medo, que não deve ser superior à vontade de vencer), pensava: daqui a pouco minha vida vai ser decidida. Independente do que ocorra, essa angústia de “O QUE SERÁ DA MINHA VIDA AFINAL?” vai ter fim. Sem mais imaginações, idealizações. A realidade e o resultados ali, nus e crus.

10 pras 4. 1h51.15h53 (nunca vou esquecer desse minuto, o MAIS LONGOO para passar). 15h54. 15h55 – começo a tentar, loucamente, entrar no site da fuvest. 15h57. 15h59 – um, apenas um minuto presente separava os últimos dois anos de um futuro de 4 ou 5 anos à minha frente. O celular toca. Helo Oi. Caramba, não vou atender. Mas se deu merda, ela já me acalma. “Alô.”, disse eu, serena, tentando me controlar pra não sair correndo daquilo tudo. “Toco, você levou apenas 2 anos pra conseguir o que eu não fiz. Parabéns. Seu nome está lá”. “Pára Helo. Eu só acredito vendo.”. Cinco minutos depois, abro: JorNot (é bem mais legal!): ALESSANDRA GOES ALVES. A partir daí só lembro de ver minha mãe afogada em lágrimas e meu pai petrificado pela imagem da tela do computador.

E desde 16 e tantas da tarde eu me encontro assim. Paralisada, descrente de que tudo isso esteja de fato ocorrendo, dos nomes que eu não achava na lista (justo os nomes que eu MAIS queria ver). E fiquei nessa: a incredulidade da minha aprovação e da desaprovação de outros.

Em suma, acho que vestibular resume até bem, a essência da vida. Um mix de emoções sem igual. O contraste de sentimentos, a simultaneidade de choros – a tristeza de um, a emoção de outros. O fim de uma etapa e o início de uma nova era para uns. O reinício [que exige tanta coragem] de outros. A certeza de que não se consegue NADA sozinho. E a confirmação de que tentar manter-se são no meio disso tudo, pedindo apenas que ocorra o que for melhor para si e para a sua família. Esse caos de ritmo doentio e de final cada vez mais incerto em que nos encontramos hoje.

Aos que conseguiram, acho que partilho do mesmo sentimento que vocês. Aos que reiniciam sua busca, toda força e garra DO MUNDO – hoje afirmo de que vale REALMENTE a pena e que, se pudesse, congelaria esse momento e tentaria absorver toda a vida e magia contida nele. Aos que enveredam por outros caminhos, que abram os seus corações ao novo eu se mostra para vocês – a calma com que atendi o telefone justifica-se pelo pensamento “o que vier será uma benção e irá me satisfazer um desejo, uma necessidade, uma busca”. Abra-se para o novo, para o inesperado, para o não-planejado e não-idealizado. Não tenha medo, pois ele é o único capaz de estragar isso a que tanto buscamos a todo instante – não sei se caminho a ser percorrido ou destino a ser alcançado: a felicidade.


Que venha a vida universitária. Eu estou aqui: de coração aberto e sorriso escancarado, transparecendo a luz que sai de minha alma. Pronta a sacrificar outros sonos – desta vez em trabalhos infinitos em grupo, em vésperas de provas e festas.



Meu coração, hoje, se pinta de roxo e amarelo.

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