domingo, 7 de março de 2010

do mundo neoliberal globalizado e a minha avó

       Inês é uma senhorinha muito simpática, cujas faces constituem-se de marcas cavadas pelos seus 80 anos. Pernambucana, Inês tem seu coração acelerado pelas primeiras batidas do frevo e deixa-se pintar pelo colorido infinito do carnaval de Recife. Filha de uma família humilde do interior de Pernambuco, Inês é um retalho de uma parte da história brasileira marcada pelo abandono e pela pobreza: a retirada nordestina rumos ao progresso e à modernidade sulista.

       Tendo vindo para São Paulo com poucos mais de 20 anos acompanhada por seu marido João, Inês teve por função, a um primeiro momento, cuidar da casa e dos filhos que banharam a  casa com luz e traquinagens, cujas marcas eram vistas no sujo das roupas e na bagunça dos quartos. Quando tornou-se viúva aos 49 anos, Inês deparou-se com novos desafios que costumam mudam (e muto) a vida de qualquer pessoa: o dever de trabalhar para prover os filhos e a dificuldade em lidar com a morte.

       Então, começou a trabalhar na copa de uma unidade Drogasil. Simpática, de sorriso tímido e unhas sempre bem feitas, Inês completou, em 2010, 28 anos de empresa. Pode-se dizer que a "sala" de Inês está entre as mais visitadas de toda a Drogasil - e o presidente dessa empresa que me perdoe, mas o café dessa nordestina é simplesmente FANTÁSTICO (Starbucks não sabe o que está perdendo). Em dias frios, como a última terça-feira, o café de Inês chega a revitalizar, aquecendo o corpo e o espírito. Chegue à sala dela, como quem não quer nada e logo mais você se deparará com uma das senhorinhas mais simpáticas que você já viu. E deixo logo avisado: nada de chamá-la de velha. Não que ela se oponha a quem goste dessa nomenclatura, mas acredite: depois de passar alguns minutos do lado dela, você se sentirá um velho rabugento, que só reclama e perde oportunidades infinitas de sorrir.

      Após visitar a dona Inês na 3a feira última, pensei em QUANTA humanidade se perde com a terceirização de serviços ou coma  substituição de pessoas por máquinas. Ok, existem diversas pessoas que são mais frias do que computadores e calculadoras mas.. eu ainda prefiro acreditar no poder de humanização de pessoas (por mais fechadas e pouco sorridentes que elas sejam). As empresas buscam lucros, incessantes e infinitos, mas me pergunto o efeito que isso tem não somente sobre o bolso de presidentes e empresários como também sobre toda a hierarquia de uma empresa -  secretários, faxineiros, recepcionistas e gerentes. Cada vez mais máquinas, menos pessoas. Ok, talvez isso acarrete menos atritos (pessoas se atritam muuito facilmente) mas também ocorra menos cooperação (ainda não podemos desabafar nossos problemas com máquinas de café expresso ou com o computador), além dos risos se tornarem mais escassos. O cenário cada vez mais robotizado de empresas talvez explique o porquê de índices de stress cada vez maiores das pessoas que ali trabalham - máquinas petrificam o ambiente com seu silêncio programado e sua frieza robotizada.

      Creio que esse seja um, dos grandes problemas a serem pensados nesse início de século. A questão é sim complexa - e quando há lucros envolvidos, essa complexidade aumenta de modo exponencial. Mas talvez espalhar algumas Inês pelas empresas - e com elas sorrisos, conversas e cafés que alimentam a alma-  seja um bom começo.

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