terça-feira, 21 de abril de 2009

um transbunde de Sant'anna

CERTAS COISAS

Certas coisas não se podem deixar para depois.
Muitas coisas perdi
pensando: "Depois escrevo,
"agora estou almoçando"
ou "consertando a porta"
Assim, adiei-me
perdi o melhor? de mim.

Certas coisas
não se podem deixar para depois,
e nisto incluo: frutos no galho
mudanças sociais,
certas coxas e bocas
e esta manhão que se esvai.

Certas coisas
não se podem deixar para depois.

A amor NÃO SE ADIA
como se adiam o imposto, a virgem, A UTOPIA.
O desejo sabe o que quer,
detesta burocracia.

Feito depois, o amor
é murcha lembrança
do que, não-sendo, seria.

Certas coisas
não se podem deixar para depois.

Como amor e as pessoas, não se pode recuperar

- a poesia.


SEPARAÇÃO

Desmontar a casa e o amor.

Despregar os sentimentos das paredes e lençóis.

Recolher a cortina após a tempestade das conversas.

O amor não resistiu às balas, pragas, flores e corpos de intermeio.

Empilhar livros, quadros discos e remorsos.

Esperar o infernal juízo final do desamor.

Vizinhos se assustam de manhã ante os destroços junto à porta

- Pareciam se amar tanto!

Houve um tempo:
uma casa de campo
fotos em Veneza,
um tempo sorridente em que sorridente
o amor aglutinava festas e jantares.


Amou-se um certo modo de despir-se,
de pentear-se.
Amou-se um sorriso e um certo
modo de botar a mesa. Amou-se
um certo modo de amar.


No entanto, o amor bate em retirada
com suas roupas amassadas, roupas de insulto
malas desesperadas, soluços embargados.


Faltou amor no amor?
Gastou-se amor no amor?
Fartou-se o amor?



No filho dos filhos outra derrota à vista:
bonecos e brinquedos pendem
numa colagem de afetos natimortos.


O amor ruiu e tem pressa de ir embora
envergonhado.


Erguerá outra casa, o amor?
Escolherá objetos, morará na praia?
Viajará na neve e na neblina?


Tonto, perplexo, sem rumo
um corpo sai porta afora
com pedaços de passado no cabeça
e um impreciso futuro.


No peito o coração pesa
mais que uma mala de chumbo.

Um daqueles dias que eu predigo, pressinto, prevejo um terremoto interno. E também externo.
(-eca, sai de mim sensação ruim!)


Alguém me vê uma colher de chá de amor, uma pitada de paciência e uma pílula de tolerância, por favor.

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